Entrevista com Abilio Diniz

Entrevista concedida aos jornalistas Raquel Landim e David Friedlander, publicada na “Folha de S. Paulo”, em 24.08.2014.

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Folha - Quais deveriam ser as prioridades do próximo governo?

Abilio Diniz - Fiz parte da câmara de gestão do governo Dilma. Foi frustrante. Não sinto que tenha feito grande coisa, mas me deu mais conhecimento sobre o governo.

A primeira sensação é: o país não é ingovernável, mas é ingerenciável. Não dá para ter 39 ministérios. Eu sou um bom gestor e não consigo administrar mais de 12 pessoas abaixo de mim.

Por que temos 39 ministérios? Temos 39 ministérios, porque os presidentes ficam reféns dos compromissos de campanha e dos acordos no Congresso para governar.

O Brasil precisa de uma reforma política, que repense o financiamento de campanha, ponha ordem na quantidade de partidos. O Brasil tem 30 partidos. Não tem sentido.

Gestão é colocar as pessoas certas nos lugares certos. No governo, as pessoas são colocadas nos cargos públicos em virtude dos compromissos de campanha.

O Supremo Tribunal Federal está a um passo de acabar o financiamento de campanha por empresas. Isso é bom ou ruim para o país?

Isoladamente, não seria uma boa medida. O foco é impedir as empresas de fazer doações. Mas existem maneiras de burlar isso. Se as pessoas físicas formarem uma ONG, as empresas contribuem para a ONG, que financia as campanhas. Só torna o processo mais longo.

O ideal seria uma nova Constituição, porque precisamos de muitas reformas.

Já cheguei a pensar muito sobre a possibilidade de chamar uma Constituinte. Não abandonei a ideia, mas não vou levantar essa bandeira. É difícil de concretizar.

Quais outras reformas são necessárias?

O próximo presidente não tem como escapar de uma reforma tributária. A carga de impostos é muito alta e estimula a sonegação. É o famoso crime que compensa, porque o lucro de sonegar é alto. A perda de participação da indústria no PIB é de longa data e não é culpa só dos juros e do câmbio. O que sucateou a indústria é esse sistema tributário complexo e absurdo.

Por que nenhum governo consegue reduzir os impostos?

Uma reforma tributária vai ferir muitos interesses. Os Estados são dependentes do ICMS. O que precisa é o presidente encarar essa batalha, seja desgastante ou não.

A Receita trata os contribuintes como delinquentes. É vexatório. Por outro lado, dada a complexidade do sistema, não há empresa que não busque formas de pagar menos imposto dentro da lei.

Dos candidatos mais bem colocados, quem tem perfil para tocar essa agenda?

Todos. E nós, da sociedade civil, temos que dar força. Os que são capazes de manifestar suas opiniões nos jornais têm que dar apoio aos governantes para fazer as reformas.

Do jeito que estou falando, até parece que o país é um desastre. Não é. Esse ainda é um país cobiçado pelos investidores. Todos ficam de olho no nosso imenso mercado interno. Desde 2003, o Brasil iniciou algo por que eu sempre clamei, que é a maior distribuição de renda. Temos quase pleno emprego e os programas assistenciais impedem que as pessoas morram na miséria.

O país deve crescer menos de 1% neste ano, completando quatro anos ruins. O que o próximo presidente precisa fazer para que os empresários voltem a investir?

Os empresários precisam de regras claras e constantes. Se acreditarem que o governo respeita aquilo que o setor privado representa, voltarão a investir. Esse governo sempre se comunicou mal. E boa parte do mau humor entre governo, empresários e sociedade é por causa da falta de comunicação.

Como você consegue a confiança de uma pessoa? Dialogando. Nós não temos interlocução (no governo). E o governo, quando se comunica, muitas vezes não esclarece as coisas. Ao fazer um anúncio é importante não deixar margem para dúvida.

Dilma hoje é a favorita. Se for reeleita, como refazer essas pontes com o empresariado?

Nesse ponto, minha preocupação é zero. Essa ponte se refaz no mesmo dia. Se a presidente tiver disposição para estender a mão, todos vão trabalhar a favor.

E mais: tenho certeza de que a presidente Dilma aprendeu bastante nesses quatro anos, que foram mais difíceis que no governo Lula. Se eleita, ela vai se aproximar mais dos empresários.

O Aécio sempre foi muito próximo dos empresários. Tenho zero de preocupação em relação ao isolamento de qualquer um deles.

E a Marina? O empresariado tem medo dela?

A Marina é uma pessoa do bem. Sempre esteve próxima de empresários. Se ela indicar agora quem será o seu ministro da Fazenda, acho que os empresários e todos os brasileiros ficarão tranquilos. Dilma deveria fazer isso também, para aumentar a confiança.

A campanha de Dilma reclama de terrorismo eleitoral no mercado financeiro. O sr. concorda?

Terrorismo é muito forte. Eu não acho. O mercado fica mais preocupado ou animado com quem ele acredita que vai fazer um jogo pró livre iniciativa. Não vejo nada feito propositadamente.

Economistas dizem que 2015 vai ser um ano de "maldades": alta de juros, reajustes de preços, corte de gastos...

Os economistas não esquecem algumas expressões como "vão abrir a caixa de maldades". Não é bem assim. Mas precisamos reajustar os preços administrados [energia, gasolina etc.] e cortar gastos [do governo].

Temos que fazer o que é preciso e essas "maldades" são temporárias. Quanto mais brusco é o ajuste, mais rápida é a recuperação.

As montadoras estão dando férias coletivas e já há demissões na construção. Na sua opinião, vai haver mais demissões no Brasil?

Todos os indicadores mostram a atividade econômica mais devagar. As empresas estão olhando seus custos para se ajustar. Mas não vejo demissões em massa de jeito nenhum.

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